sábado, 30 de julho de 2011

Advogado não responde pessoalmente por litigância de má-fé

26/07/2011 - 09h02

DECISÃO


A pena por litigância de má-fé deve ser aplicada à parte e não ao seu advogado. A decisão é da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que proveu recurso de um advogado contra a Fazenda Nacional. A Turma, seguindo voto do relator, ministro Humberto Martins, entendeu que o advogado não pode ser penalizado no processo em que supostamente atua como litigante de má-fé, ainda que incorra em falta profissional. Eventual conduta desleal do advogado deve ser apurada em ação própria e não no processo em que defende seu cliente.



No caso, o advogado recorreu ao STJ após decisão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) que o responsabilizou por litigância de má-fé e determinou a compensação dos honorários advocatícios com o valor fixado para a multa.



Ainda em sua defesa, argumentou que a compensação dos valores não poderia ter sido feita, já que ele jamais poderia ter sido pessoalmente condenado por litigância de má-fé. Para ele, apenas as partes ou o interveniente podem ser condenados. Por fim, afirmou que os honorários advocatícios não poderiam ser compensados, pois estes pertencem unicamente aos advogados e não às partes.



Ao decidir, o ministro Humberto Martins destacou que a solução adotada pelo tribunal regional não está de acordo com a legislação processual vigente, já que o valor referente à multa por litigância de má-fé não pode ser compensado com os honorários devidos ao advogado.



“Conforme expressa determinação legal, eventual condenação do advogado pela litigância de má-fé deve ser apurada em ação própria, e não nos mesmos autos em que defende seu cliente”, acrescentou o relator.

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Veja o inteiro teor do acórdão:

Superior Tribunal de Justiça
Revista Eletrônica de Jurisprudência

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RECURSO ESPECIAL Nº 1.247.820 - AL (2011⁄0077668-3)

RELATOR

:

MINISTRO HUMBERTO MARTINS

RECORRENTE

:

ANTÔNIO FERNANDO MENEZES BATISTA DA COSTA

ADVOGADO

:

JÚLIO ALCINO DE OLIVEIRA NETO

RECORRIDO

:

FAZENDA NACIONAL

PROCURADOR

:

PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. COMPENSAÇÃO COM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPOSSIBILIDADE.

1. A pena por litigância de má-fé deve ser aplicada à parte, e não ao seu advogado, nos termos dos arts. 14 e 16 do Código de Processo Civil.

2. O advogado não pode ser penalizado nos autos em que supostamente atua como litigante de má-fé, ainda que incorra em falta profissional. Eventual conduta desleal do advogado deve ser apurada em processo autônomo, nos termos do art. 32 do Estatuto da Advocacia (Lei 8906⁄94).

3. Precedentes: REsp 1.194.683⁄MG, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 17.8.2010, DJe 26.8.2010; REsp 1.173.848⁄RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 20.4.2010, DJe 10.5.2010.

Recurso especial provido, para afastar a litigância de má-fé.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça: "A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator, sem destaque." Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques e Castro Meira votaram com o Sr. Ministro Relator.

Não participou, justificadamente, do julgamento o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha.

Brasília (DF), 28 de junho de 2011(Data do Julgamento)

MINISTRO HUMBERTO MARTINS

Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 1.247.820 - AL (2011⁄0077668-3)

RELATOR

:

MINISTRO HUMBERTO MARTINS

RECORRENTE

:

ANTÔNIO FERNANDO MENEZES BATISTA DA COSTA

ADVOGADO

:

JÚLIO ALCINO DE OLIVEIRA NETO

RECORRIDO

:

FAZENDA NACIONAL

PROCURADOR

:

PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL

RELATÓRIO


O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS (Relator):

Cuida-se de recurso especial interposto por ANTÔNIO FERNANDO MENEZES BATISTA DA COSTA, com fundamento no art. 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, assim ementado:

"PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. SENTENÇA DE PROCESSO CAUTELAR. INTIMAÇÃO DO INSS NA PESSOA DE ADVOGADO CREDENCIADO. NULIDADE. AUSÊNCIA. SUBMISSÃO À REMESSA OFICIAL. DESNECESSIDADE. EXCESSO DE CONDENAÇÃO NA VERBA HONORÁRIA. REDUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE NA VIA DOS EMBARGOS. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. CARACTERIZAÇÃO. INDENIZAÇÃO DOS HONORÁRIOS. CONDENAÇÃO ZERADA.

1. A sentença prolatada na ação cautelar (título executivo judicial) teve seu conteúdo cientificado ao INSS por intermédio de intimação pessoal de advogado reconhecidamente credenciado pelo Instituto à época. Se dela não foi interposto recurso de apelação, a despeito de cabível, não significa nulidade da sentença, no máximo podendo-se discutir eventual responsabilidade pessoal do causídico em ação própria.

2. Antes das alterações decorrentes da edição inicial da Lei 9.469, de 10-07-97, a sentença proferida contra autarquia somente estava sujeita ao duplo grau de jurisdição obrigatório na hipótese prevista no inciso III do artigo 4 75 do CPC (sentença que julga improcedente a execução de dívida ativa da Fazenda Pública), o que não é o caso dos autos, em que se cuida de sentença prolatada em ação cautelar, logo não era exigível para a eficácia do decisum à época a sua submissão à remessa necessária.

3. No momento de iniciar-se a execução de sentença, em 24⁄07⁄1996, a condenação em honorários, fixada em 10% sobre o valor da causa, representava R$337.180,17 (trezentos e trinta e sete mil, cento e oitenta reais e dezessete centavos). Ainda que esses honorários sejam evidentemente excessivos (considerando a natureza da causa e o simples trabalho realizado pelo causídico) e tenham sido fixados equivocadamente mediante percentual do valor da causa, quando deveriam ter sido fixados equitativamente, já que a sentença foi de extinção sem resolução de mérito por ausência de interesse processual (logo não houve condenação), estando acobertado o título pelo manto da coisa julgada, não cabe redução daquela condenação em honorários em sede de embargos à execução.

4. A litigância de má-fé, cognoscível pelo Juízo de ofício, se verifica quando uma das partes altera a verdade de fatos, com intenção de provocar dano processual à parte adversa, nos termos do art. 17, II, do CPC, justificando-se, na hipótese, a indenização dos prejuízos causados e dos honorários de sucumbência arbitrados, conforme art. 18, do CPC, na redação vigente à época dos fatos.

5. No caso em tela, tendo a ora recorrida alegado que já havia oferecido bens à penhora na execução desde antes do ajuizamento da ação cautelar de indisponibilidade de bens, quando, na verdade, ao tempo desse ajuizamento, nenhuma nomeação de bens ocorrera e aquela posteriormente levada a cabo somente foi aceita após já deferida a liminar na cautelar, levou o Juízo a erro, ocasionando a extinção do feito cautelar sem resolução de mérito, por ausência de interesse processual e com condenação em honorários. Acaso houvesse agido a parte com lealdade processual, no máximo haveria reconhecimento de perda superveniente de objeto da cautelar, sendo consabido que, nessa hipótese, em homenagem ao princípio da causalidade, não se condena o autor da ação em honorários de sucumbência, por ser a perda de interesse processual superveniente ao ajuizamento da ação. Caso em que compete à litigante de má-fé ressarcir à parte contrária os honorários de sucumbência que desta receberia, zerando-se, por conseqüência, a condenação na verba honorária.

6. Apelação a que se dá provimento." (fl. 141).

Aduz o recorrente que o acórdão violou o art. 18 do CPC, porquanto manteve a condenação do recorrente na multa por litigância de má-fé, no percentual de 10%, quando, na verdade, a lei impõe que seja não excedente a 1% (um por cento).

Alega que o acórdão violou os arts. 14 e 16 do CPC, pois "a compensação dos valores nunca poderia ter sido feita, uma vez que o ora Recorrente jamais poderia ter sido pessoalmente 'condenado' por litigância de má-fé. (....) apenas as partes ou o interveniente podem ser condenados por litigância de má-fé, com fulcro no art. 16 do Código de Processo Civil." (fls. 205-e)

Afirma o recorrente que houve violação do art. 23 da Lei n. 8.604⁄94 e art. 380 do Código Civil porque "além de o ora recorrente não poder ser condenado por litigância de má-fé, os honorários advocatícios jamais poderiam ser compensados, uma vez que estes pertencem unicamente aos advogados e não as partes." (fls. 215-e)

Apresentadas as contrarrazões às fls. 386⁄389-e, sobreveio o juízo de admissibilidade positivo da instância de origem (fl. 390-e).

É, no essencial, o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.247.820 - AL (2011⁄0077668-3)

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. COMPENSAÇÃO COM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPOSSIBILIDADE.

1. A pena por litigância de má-fé deve ser aplicada à parte, e não ao seu advogado, nos termos dos arts. 14 e 16 do Código de Processo Civil.

2. O advogado não pode ser penalizado nos autos em que supostamente atua como litigante de má-fé, ainda que incorra em falta profissional. Eventual conduta desleal do advogado deve ser apurada em processo autônomo, nos termos do art. 32 do Estatuto da Advocacia (Lei 8906⁄94).

3. Precedentes: REsp 1.194.683⁄MG, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 17.8.2010, DJe 26.8.2010; REsp 1.173.848⁄RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 20.4.2010, DJe 10.5.2010.

Recurso especial provido, para afastar a litigância de má-fé.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS (Relator):

O tema central do presente recurso trata da possibilidade de condenar o advogado pessoalmente pela litigância de má-fé, decorrente de julgado que determinou a compensação dos honorários advocatícios com o valor arbitrado pela litigância de má-fé. Subsidiariamente, pede redução da referida multa, pois, segundo o recorrente, o limite máximo seria de 1%, nos termos do art. 18 do Código de Processo Civil.

CONDENAÇÃO PESSOAL DO ADVOGADO PELA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ

O Tribunal Regional Federal da 5ª Região determinou que "deverá arcar o litigante de má-fé com os valores de honorários fixados em seu favor e, pois, justifica-se a compensação dos valores que ele teria a receber com aqueles que, a título de indenização, teria de pagar, resultando em valor zero de honorários devidos" (fl. 139-e).

Para melhor ilustração do caso, transcrevo o seguinte trecho do acórdão recorrido:

"Como o art. 18 do CPC estabelecia, na redação vigente ao tempo dos fatos em comento, que o litigante de má-fé deveria indenizar à parte contrária os prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou, deverá arcar o litigante de má-fé com os valores de honorários fixados em seu favor e, pois, justifica-se a compensação dos valores que ele teria a receber com aqueles que, a título de indenização, teria de pagar, resultando em valor zero de honorários devidos.

Dessarte, deve ser reformada a sentença prolatada na execução de título judicial, para, reconhecendo-se a litigância de má-fé da exequente quando de sua manifestação na ação cautelar, alterando a verdade dos fatos (art. 17, II, do CPC), reconhecer-se o seu dever de indenizar à parte contrária o exato importe do valor de honorários que esta teria de despender em seu favor, resultando, ao final, zerada a condenação na verba honorária."

Ao assim determinar, o acórdão acabou por responsabilizar pessoalmente o advogado pela litigância de má-fé, pois determina que os honorários a que tinha direito sejam "zerados". Todavia, determinam os arts. 14 e 16 do Código de Processo Civil que é da responsabilidade da "parte" a reparação decorrente da litigância de má-fé.

"Art. 14. São deveres das partes e de todos aqueles que de qualquer forma participam do processo:

II - proceder com lealdade e boa-fé;

Parágrafo único. Ressalvados os advogados que se sujeitam exclusivamente aos estatutos da OAB, a violação do disposto no inciso V deste artigo constitui ato atentatório ao exercício da jurisdição, podendo o juiz, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis, aplicar ao responsável multa em montante a ser fixado de acordo com a gravidade da conduta e não superior a vinte por cento do valor da causa; não sendo paga no prazo estabelecido, contado do trânsito em julgado da decisão final da causa, a multa será inscrita sempre como dívida ativa da União ou do Estado. (Incluído pela Lei nº 10.358, de 27.12.2001)

Art. 16. Responde por perdas e danos aquele que pleitear de má-fé como autor, réu ou interveniente." (artigo inserido no capítulo de "responsabilidade das partes")

Somente as partes poderiam ser condenadas por litigância de má-fé, e não a figura do advogado que atuou na causa. A decisão, tal qual foi lavrada na instância de origem, acaba por penalizar o próprio advogado, pois determinou a "compensação dos honorários advocatícios com o valor fixado pela litigância de má-fé".

O advogado pode - e deve - ser responsabilizado na seara própria, como determina o art. 32 do Estatuto da OAB, mas não nos autos em que defende seu cliente.

A propósito, "in verbis" o dispositivo legal citado:

"Art. 32. O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa.

Parágrafo único. Em caso de lide temerária, o advogado será solidariamente responsável com seu cliente, desde que coligado com este para lesar a parte contrária, o que será apurado em ação própria."

Conforme expressa determinação legal, eventual condenação do advogado pela litigância de má-fé deve ser apurado em ação própria, e não nos mesmos autos em que defende seu cliente.

A propósito, os seguintes precedentes:

"CIVIL E PROCESSO CIVIL. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA DO ADVOGADO. IMPOSSIBILIDADE.

1. É vedada a esta Corte apreciar violação a dispositivos constitucionais, sob pena de usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal.

2. Inviável o conhecimento do recurso especial no que concerne ao alegado julgamento "ultra petita", pois, nas razões do apelo excepcional, não há indicação de qualquer dispositivo infraconstitucional pretensamente violado. Súmula nº 284⁄STF.

3. Revisar a decisão que reconheceu a má-fé do recorrente somente seria possível mediante incursão indevida nas provas produzidas nas instâncias ordinárias, o que é defeso em sede de recurso especial, Incidência da súmula nº 07⁄STJ.

4. Responde por litigância de má-fé (arts. 17 e 18) quem causar dano com sua conduta processual. Contudo, nos termos do art. 16, somente as partes, assim entendidas como autor, réu ou interveniente, em sentido amplo, podem praticar o ato. Com efeito, todos que de qualquer forma participam do processo têm o dever de agir com lealdade e boa-fé (art. 14, do CPC). Em caso de má-fé, somente os litigantes estarão sujeitos à multa e indenização a que se refere o art. 18, do CPC.

5. Os danos eventualmente causados pela conduta do advogado deverão ser aferidos em ação própria para esta finalidade, sendo vedado ao magistrado, nos próprios autos do processo em que fora praticada a alegada conduta de má-fé ou temerária, condenar o patrono da parte nas penas a que se refere o art. 18, do Código de Processo Civil.

6. Recurso especial conhecido em parte e, nesta parte, provido."

(REsp 1.173.848⁄RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 20.4.2010, DJe 10.5.2010 - grifei.)

"PROCESSUAL CIVIL - RECURSO ESPECIAL - VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CARACTERIZADA - LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. CONDENAÇÃO DO ADVOGADO. IMPOSSIBILIDADE.

1. Não ocorre ofensa ao art. 535, II, do CPC, se o Tribunal de origem decide, fundamentadamente, as questões essenciais ao julgamento da lide.

2. O ressarcimento dos danos eventualmente causados pela conduta do advogado deverá ser verificado em ação própria, não cabendo, nos próprios autos do processo em que fora praticada a alegada conduta de má-fé ou temerária, a condenação do advogado nas penas a que se refere o art. 18 do Código de Processo Civil.

3. Recurso especial conhecido e parcialmente provido para afastar da sentença a condenação do advogado do recorrente nas penalidades do artigo 18 do CPC.

(REsp 1.194.683⁄MG, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 17.8.2010, DJe 26.8.2010.)

Portanto, a solução adotada pelo Tribunal "a quo" não está de acordo com a legislação processual vigente, pois não pode o valor referente à indenização por litigância de má-fé ser compensado com os honorários devidos ao causídico.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial para afastar a condenação em litigância de má-fé.

É como penso. É como voto.

MINISTRO HUMBERTO MARTINS

Relator

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

SEGUNDA TURMA

Número Registro: 2011⁄0077668-3


PROCESSO ELETRÔNICO

REsp 1.247.820 ⁄ AL

Números Origem: 2000007613 200405990011557 76132000

PAUTA: 28⁄06⁄2011

JULGADO: 28⁄06⁄2011

Relator

Exmo. Sr. Ministro HUMBERTO MARTINS

Presidente da Sessão

Exmo. Sr. Ministro HERMAN BENJAMIN

Subprocuradora-Geral da República

Exma. Sra. Dra. ELIZETA MARIA DE PAIVA RAMOS

Secretária

Bela. VALÉRIA ALVIM DUSI

AUTUAÇÃO

RECORRENTE

:

ANTÔNIO FERNANDO MENEZES BATISTA DA COSTA

ADVOGADO

:

JÚLIO ALCINO DE OLIVEIRA NETO

RECORRIDO

:

FAZENDA NACIONAL

PROCURADOR

:

PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL

ASSUNTO: DIREITO TRIBUTÁRIO - Crédito Tributário - Repetição de indébito

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEGUNDA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator, sem destaque."

Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques e Castro Meira votaram com o Sr. Ministro Relator.

Não participou, justificadamente, do julgamento o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha.

Documento: 1073200

Inteiro Teor do Acórdão

- DJe: 01/07/2011

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sexta-feira, 8 de julho de 2011

TEORIA DO FATO CONSUMADO



Por Luiz Carlos Nogueira

nogueirablog@gmail.com

A Teoria do Fato Consumado se explica pela decorrência de um logo tempo em que um ato administrativo ilegal foi praticado por uma autoridade competente, consolidando-se de tal forma, que resulta no reconhecimento de um direito.

Por exemplo, a nomeação de um servidor público, que não tivesse reunido na época, um ou mais requisitos complementares exigidos por edital, tendo assim permanecido irregular no cargo por alguns anos, de tal sorte, não mais caberia à autoridade administrativa anular seu ato, tendo em vista que a experiência adquirida pelo servidor, seria suficiente para suprir as lacunas. É claro que não seria o caso de convalescer um ato em que não foi cumprida a exigência, por exemplo, de apresentação de diploma necessário para um advogado, um contabilista, um médico, para exercer os cargos que lhes são reservados. Não poderia um mecânico ocupar um desses cargos mencionados, porque o ato de nomeação nesse caso implicaria em nulidade. Do contrário nem haveria como o mecânico executar os serviços desses profissionais, para assim obter experiência.

Portanto, em circunstâncias em que o cargo não exige formação como já exemplificado, ou seja, de advogado, contabilista, médico, não seria correto decretar tardiamente a nulidade do ato. Quando há inércia da autoridade competente, isto é, quando a autoridade deixa de tomar as providências necessárias em tempo hábil, para corrigir o erro, permitindo ou consentindo dessa forma, a existência de uma situação de fato, por um longo tempo, como se legal fosse, resultando que o servidor consiga adquirir experiência suficiente para o desempenho de suas funções, afigura-se inadequado um ato para destituí-lo do cargo, até porque se a administração pública trabalhar com a hipótese de poder, por tempo indefinido, rever os seus atos, fragilizaria a segurança das relações sociais.

Ora, é bem verdade que existe a Súmula 473 do Supremo Tribunal Federal que diz:

Súmula nº 473

A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.”

Mas é exatamente por isso que há de ser aplicada a Teoria do Fato Consumado, porque esses casos não podem escapar da apreciação judicial, uma vez que consolidam direitos adquiridos e a Administração Pública não tem o condão de considerar o seu poder-dever ilimitado, para rever seus atos.

Em recente decisão (REsp 1200904) que temos notícia, o Superior Tribunal de Justiça manteve no cargo um agente da Polícia Federal que há oito anos contados da sua nomeação até o julgamento do recurso de apelação interposto pela Polícia Federal do Estado do Espírito Santo no TRF da 2ª Região. Imperou, no caso, a Teoria do Fato Consumado, contrariando assim a jurisprudência do órgão, tendo em vista a situação do agente que havia se consolidado no tempo, e portanto, a liminar que permitiu com que o mesmo fosse nomeado de forma irregular, deve prevalecer, não obstante o ministro Humberto Martins (relator) tivesse evidenciado que a força da tese de que o fato consumado não protege decisões precárias, como foi o caso da liminar concedida. Para o ministro relator “A situação do policial, no entanto, ganhou solidez após tantos anos no exercício do cargo e, o que é pior, com o respaldo do Poder Judiciário”.

A justificativa para o afastamento da jurisprudência, vincou-se no fato de que a situação do agente era bem peculiar e por isso afastam os precedentes aplicados por aquela Corte de Justiça. No caso o agente havia sido reprovado na prova de aptidão física, mas por conta da liminar obtida no juízo de primeira instância, depois confirmada por sentença, propiciou-lhe uma segunda chamada.

A decisão, o relator faz referência a Odim Brandão Ferreira (in Fato Consumado, História e Crítica de uma orientação da Jurisprudência Federal, Porto Alegre, 2002, p.19) informando que: “a teoria do fato consumado nasceu em alguns julgados do Supremo Tribunal Federal - STF da década de 1960. Naquela época, várias ações questionavam a possibilidade de regimentos internos de universidades exigirem de seus alunos ‘nota cinco’ para aprovação, até o STF editar o Enunciado da Súmula 58: ’é válida a exigência de média superior a quatro para a aprovação em estabelecimento de ensino superior, consoante o respectivo regimento’.

“Entretanto, a edição da referida súmula não resolvia os casos dos estudantes que obtinham liminares, ingressando em faculdades ou cursando disciplinas acadêmicas sob o pálio dessas decisões provisórias.”

“Diante disso, originou-se a teoria do fato consumado, com o STF chancelando os estudos realizados com base em provimentos cautelares ilegais, sob o pretexto inicial de dúvida objetiva sobre a validade dos regimentos universitários ou até mesmo eqüidade.”

“É por isso que o fato consumado nada mais é do que ‘o argumento judicial utilizado para validar, em sentenças, as atividades ilegais protegidas por liminares, tão-somente porque o beneficiário delas já praticou o ato que lhe interessava, quando chegado o momento de decidir a causa’. E a principal causa do fato consumado é, como bem identifica a Desembargadora Federal Marga Inge Barth ‘a criticada e combatida ‘lentidão do Judiciário’ que enseja a ocorrência da consumação dos fatos, quase sempre à revelia da lei’.”

Veja o teor da decisão:


Superior Tribunal de Justiça
Revista Eletrônica de Jurisprudência

EDcl no AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.200.904 - ES (2010⁄0115205-9)

RELATOR

:

MINISTRO HUMBERTO MARTINS

EMBARGANTE

:

UNIÃO

EMBARGADO

:

CARLOS AUGUSTO VALIATE MARTINS

ADVOGADO

:

TIAGO ROCON ZANETTI

EMENTA

RECURSO DE FUNDAMENTAÇÃO VINCULADA. AUSÊNCIA DE OMISSÃO. QUESTÕES PRECLUSAS POR AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL. REDISCUSSÃO DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE.

1. Os embargos de declaração fazem questionamentos a respeito de matéria que sequer foi arguida no agravo regimental.

2. Na decisão monocrática de fls. 1223⁄1229-e, este Relator deu provimento ao recurso especial interposto por Carlos Augusto Valiate Martins, ao fundamento da aplicação da teoria do fato consumado. Contra esta decisão, a União interpôs agravo regimental, às fls. 1234⁄1238-e, cujo objeto foi, única e exclusivamente, a ausência de prequestionamento que impediria o conhecimento do recurso especial.

3. O agravo regimental foi improvido; e agora, em embargos de declaração, a União volta a fazer questionamentos sobre a inaplicabilidade da teoria do fato consumado ao caso concreto. Trata-se, na verdade, de um completo desvirtuamento dos aclaratórios, que não servem para rediscutir julgados, muito menos para reavivar questões preclusas, por ausência de impugnação no momento processual adequado.

Embargos rejeitados.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça: "A Turma, por unanimidade, rejeitou os embargos de declaração, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator, sem destaque." Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques, Cesar Asfor Rocha e Castro Meira votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 17 de maio de 2011(Data do Julgamento)

MINISTRO HUMBERTO MARTINS

Relator

EDcl no AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.200.904 - ES (2010⁄0115205-9)

RELATOR

:

MINISTRO HUMBERTO MARTINS

EMBARGANTE

:

UNIÃO

EMBARGADO

:

CARLOS AUGUSTO VALIATE MARTINS

ADVOGADO

:

TIAGO ROCON ZANETTI

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS (Relator):

Cuida-se de embargos de declaração opostos pela UNIÃO contra acórdão da Segunda Turma que negou provimento ao agravo regimental, nos termos da seguinte ementa:

"PROCESSUAL CIVIL. PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE QUE DIFERE DO JUÍZO DE REJULGAMENTO. ABERTURA DE INSTÂNCIA. PROFUNDIDADE DO EFEITO DEVOLUTIVO. SÚMULA 456⁄STF. APLICAÇÃO DO DIREITO À ESPÉCIE.

1. O Tribunal de origem quando julgou a causa apreciou a questão da violação do princípio da razoabilidade, o que configura o prequestionamento implícito do art. 2º da Lei n. 9.784⁄99.

2. Conhecido o recurso especial por qualquer dos seus fundamentos, opera-se a abertura de instância, de modo que, ao julgá-lo, poderá esta Corte Superior conhecer de ofício, ou por provocação, de todas as matérias que podem ser alegadas a qualquer tempo, bem como, de todas as questões suscitadas e discutidas no processo, mesmo que não tenham sido enfrentadas no acórdão recorrido.

3. É preciso fazer uma diferenciação entre o juízo de admissibilidade e juízo de rejulgamento. Para ser admitido o recurso especial, é indispensável o prequestionamento; mas, uma vez admitido, no juízo de rejulgamento não há qualquer limitação cognitiva, a não ser a limitação horizontal estabelecida pelo recorrente.

4. Trata-se do chamado efeito translativo (profundidade do efeito devolutivo), reconhecido na Sumula 456⁄STF, segundo a qual, 'O Supremo Tribunal Federal, conhecendo do recurso extraordinário, julgará a causa, aplicando o direito à espécie.'

Agravo regimental improvido." (fl. 1247-e)

Alega a embargante que "o acórdão recorrido, data venia, omitiu-se ao deixar de apreciar questões importantíssimas para a defesa da embargante, principalmente no que diz respeito à NÃO CONTINUIDADE do exercício do autor no cargo de Agente de Polícia Federal, uma vez que o mesmo já foi destituído do cargo há quase DOIS ANOS." (fl. 1259-e)

Aduz que "NÃO HÁ SITUAÇÃO CONSOLIDADA pelo decurso do tempo, uma vez que o autor já foi destituído do cargo há quase DOIS ANOS. A situação, portanto, já foi revertida, caracterizando, portanto, óbice à aplicação da Teoria do Fato Consumado à espécie." (fls. 1261-e)

Pugna pelo acolhimento dos embargos de declaração, com efeitos infringentes.

O embargado ofereceu impugnação às fls. 1268⁄1285-e.

É, no essencial, o relatório.

EDcl no AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.200.904 - ES (2010⁄0115205-9)

EMENTA

RECURSO DE FUNDAMENTAÇÃO VINCULADA. AUSÊNCIA DE OMISSÃO. QUESTÕES PRECLUSAS POR AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL. REDISCUSSÃO DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE.

1. Os embargos de declaração fazem questionamentos a respeito de matéria que sequer foi arguida no agravo regimental.

2. Na decisão monocrática de fls. 1223⁄1229-e, este Relator deu provimento ao recurso especial interposto por Carlos Augusto Valiate Martins, ao fundamento da aplicação da teoria do fato consumado. Contra esta decisão, a União interpôs agravo regimental, às fls. 1234⁄1238-e, cujo objeto foi, única e exclusivamente, a ausência de prequestionamento que impediria o conhecimento do recurso especial.

3. O agravo regimental foi improvido; e agora, em embargos de declaração, a União volta a fazer questionamentos sobre a inaplicabilidade da teoria do fato consumado ao caso concreto. Trata-se, na verdade, de um completo desvirtuamento dos aclaratórios, que não servem para rediscutir julgados, muito menos para reavivar questões preclusas, por ausência de impugnação no momento processual adequado.

Embargos rejeitados.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS (Relator):

A embargante opõe um recurso de fundamentação vinculada - que só admite impugnação de decisões omissas, obscuras ou contraditórias - com o objetivo de rediscutir o julgado, alegando omissão inexistente.

Não bastasse isso, os embargos de declaração fazem questionamentos a respeito de matéria que sequer foi arguida no agravo regimental.

Explica-se melhor.

Na decisão monocrática de fls. 1223⁄1229-e, este Relator deu provimento ao recurso especial interposto por Carlos Augusto Valiate Martins, ao fundamento da aplicação da teoria do fato consumado.

Contra esta decisão, a União interpôs agravo regimental, às fls. 1234⁄1238-e, cujo objeto foi, única e exclusivamente, a ausência de prequestionamento que impediria o conhecimento do recurso especial.

O agravo regimental foi improvido; e agora, em embargos de declaração, a União volta a fazer questionamentos sobre a inaplicabilidade da teoria do fato consumado ao caso concreto. Trata-se, na verdade, de um completo desvirtuamento dos aclaratórios, que não servem para rediscutir julgados, muito menos para reavivar questões preclusas, por ausência de impugnação no momento processual adequado.

Ante o exposto, rejeito os presentes embargos de declaração.

É como penso. É como voto.

MINISTRO HUMBERTO MARTINS

Relator

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

SEGUNDA TURMA

EDcl no AgRg no

Número Registro: 2010⁄0115205-9


REsp 1.200.904 ⁄ ES

Números Origem: 200050010114095 200150010002080 351055

PAUTA: 17⁄05⁄2011

JULGADO: 17⁄05⁄2011

Relator

Exmo. Sr. Ministro HUMBERTO MARTINS

Presidente da Sessão

Exmo. Sr. Ministro HUMBERTO MARTINS

Subprocurador-Geral da República

Exmo. Sr. Dr. CARLOS EDUARDO DE OLIVEIRA VASCONCELOS

Secretária

Bela. VALÉRIA ALVIM DUSI

AUTUAÇÃO

RECORRENTE

:

CARLOS AUGUSTO VALIATE MARTINS

ADVOGADO

:

TIAGO ROCON ZANETTI

RECORRIDO

:

UNIÃO

ASSUNTO: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO - Concurso Público ⁄ Edital - Exame de Saúde e⁄ou Aptidão Física

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

EMBARGANTE

:

UNIÃO

EMBARGADO

:

CARLOS AUGUSTO VALIATE MARTINS

ADVOGADO

:

TIAGO ROCON ZANETTI

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEGUNDA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Turma, por unanimidade, rejeitou os embargos de declaração, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator, sem destaque."

Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques, Cesar Asfor Rocha e Castro Meira votaram com o Sr. Ministro Relator.

Documento: 1061897

Inteiro Teor do Acórdão

- DJe: 24/05/2011