A ação penal em que figuram como réus Carlinhos Cachoeira e outras 80
pessoas vinculadas à sua quadrilha está acéfala. O juiz federal que
ordenou a deflagração da Operação Monte Carlo, Paulo Augusto Moreira
Lima, não é mais o responsável pela 11a Vara da Seção Judiciária de Goiás, onde corre o processo.
Por ordem do desembargador Mário César Ribeiro, presidente do Tribunal Regional Federal da 1a Região,
sediado em Brasília, o magistrado Moreira Lima passará a dar
expediente, nesta segunda-feira (18), noutra frequesia, a 12a Vara da mesma Seção Judiciária de Goiás. Vai substituir o colega Társis Augusto de Santa Lima.
O blog obteve cópia do ato que formalizou a troca. Leva o número 882.
Foi assinado, sem alarde, há três dias, na última quinta-feira (14).
Anota que Moreira Lima vai à 12a Vara, “com prejuízo de suas funções na 11a
Vara”, onde vinha atuando como juiz substituto. Significa dizer que as
ações que presidia até então, entre elas a Monte Carlo, já não lhe dizem
respeito.
O documento não faz menção às razões do seu deslocamento. Limita-se a
informar que a dança de cadeiras decorre do “processo administrativo
número 4.319/2012”. Nos subterrâneos, o que se diz é que o próprio
magistrado pediu para trocar de ares. Pela lei, os juízes são
‘inamovíveis’.
O processo da Monte Carlo deve ir às mãos do juiz Leão Aparecido
Alves. Ainda que ele aceite a incumbência, a ação do caso Cachoeira será
empurrada para uma fase de hibernação. O magistrado terá de desbravar
53 volumes. Apenas a transcrição dos grampos telefônicos ocupa 36
volumes. Estão anexados aos autos, de resto, mais de uma centena de
relatórios da Polícia Federal.
A análise de todo o material demandará tempo. O caso envolve, além de
Cachoeira, uma quadrilha de 80 pessoas. Entre elas seis delegados e
dois agentes da polícia civil goiana, dois delegados e um servidor da
própria Polícia Federal, 30 policiais militares e um servidor da Polícia
Rodoviária Federal.
A mudança no comando do processo ocorre em momento delicado. Na
última terça-feira (12), dois dias antes da assinatura do ato de
transferência do juiz Moreira Lima, iniciou-se na 3a turma do
TRF-1 um julgamento que pode levar à anulação dos grampos telefônicos
colecionados pela Polícia Federal na Operação Monte Carlo.
Discute-se um habeas corpus ajuizado por Márcio Thomaz Bastos e sua
equipe, defensores de Cachoeira. Alega-se na petição que a investigação
estaria viciada por ter nascido de uma denúncia anônima. Relator do
caso, o desembargador Tourinho Neto deu razão à defesa de Cachoeira.
No
seu voto, Tourinho Neto (foto ao lado) anotou que o sigilo das
comunicações telefônicas é assegurado pela Constituição. Só pode ser
quebrado em casos excepcionais. Para o desembargador, o juiz Moreira
Lima autorizou as escutas sem fundamentar adequadamente a decisão.
Assim, as provas seriam ilegais e devem ser anuladas.
Integram a 3a turma do TRF-1 três desembargadores
–Tourinho Neto e outros dois. Um deles, Cândido Ribeiro, pediu vista dos
autos, adiando a decisão. O julgamento deve ser retomado nesta semana.
Basta que um dos desembargadores siga o voto do relator para que todas
as escutas da Monte Carlo sejam enviadas ao lixo.
A perspectiva de anulação das provas deixa desalentados os
procuradores da República Daniel de Resende Salgado e Léa Batista de
Oliveira, que acompanham o caso Cachoeira pelo Ministério Público
Federal. Em privado, a dupla avalia que, prevalecendo o entendimento de
Tourinho Neto, ficarão comprometidos os inquéritos e as ações penais
abertas contra Cachoeira e seu bando.
O questionamento das provas é apenas parte da guerrilha judicial que
assedia a Monte Carlo. Ironicamente, coube a Márcio Thomaz Bastos
protagonizar a ofensiva. Ex-ministro da Justiça de Lula, ele vem
colecionando êxitos que minam o inquérito feito pela Polícia Federal que
já dirigiu.
Graças a Thomaz Bastos, o processo contra Cachoeira encontra-se em
banho-maria desde 31 de maio. Nesse dia, o juiz Moreira Lima deveria ter
tomado o depoimento do contraventor, de outros seis réus e de 15
testemunhas. Seria a primeira audiência de instrução da ação penal.
Julgando um habeas corpus da defesa de Cachoeira, o desembargador
Tourinho Neto suspendeu as oitivas.
O magistrado Moreira Lima havia determinado o desmembramento do
processo. Desejava acelerar o julgamento dos réus que se encontravam
presos, entre eles Cachoeira. Thomaz Bastos alegou que o desmembramento
prejudicou a defesa. Por quê? Como a denúncia inclui o crime de formação
de quadrilha, o que for declarado por um réu pode influir no destino
dos outros. Portanto, todos teriam de ser julgados em conjunto.
Para
fundamentar o pedido de suspensão do depoimento de Cachoeira, Thomaz
Bastos citou o processo do mensalão, no qual os 38 réus, mesmo os que
não têm mandato, estão submetidos ao mesmo foro privilegiado do STF. Ao
acolher as alegações, o desembargador Tourinho deu-lhe razão. Anotou:
“Observe-se o que afirmou o ministro Joaquim Barbosa, citado pelas
impetrantes, no processo conhecido por mensalão, em que são denunciadas
40 pessoas: ‘o contexto em que tais fatos ocorreram não aconselha esse
desmembramento, sob pena de perdermos a sequência lógica e a conjunta em
que teriam sido praticados os crimes. Isso para o julgador.’ Para a
defesa, seria pior.”
Ironicamente, o trecho citado por Tourinho Neto fora escrito num
despacho em que, vinte dias antes, Joaquim Barbosa indeferira um recurso
do mesmo Thomaz Bastos. O ex-ministro defende no STF um dos réus do
mensalão: José Roberto Salgado, ex-diretor do Banco Rural.
Como seu cliente não tem mandato eletivo, Thomaz Bastos solicitara
que as acusações contra ele fossem apartadas do processo principal e
enviadas para a primeira instância do Judiciário.
Quer dizer: o advogado pediu no STF o oposto do que iria requerer no
TRF-1 vinte dias depois: o desmembramento dos autos. E utilizou em favor
de Cachoeira os mesmos argumentos que o ministro da Corte Suprema usara
para negar o que pretendia para José Salgado, o outro cliente.
Como se fosse pouco, os últimos oito réus da Monte Carlo que
continuavam presos estão deixando, um após o outro, a cadeia. O próprio
Cachoeira obteve na sexta-feira (15) uma liminar ordenando sua
libertação. Expediu-a o mesmo desembargador Tourinho Neto, sempre ele.
A ordem só não foi cumprida porque está em vigor um decreto de prisão
do contraventor baixado noutra ação penal. Decorrência da Operação
Saint Michel. Trata-se, por assim dizer, de um filhote da Monte Carlo.
Fonte: Blog do Josias
– Clique neste link para conferir:
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